junho 11, 2017

Norwegian Wood (1987)

“Norwegian Wood” é Murakami num estado mais puro e realista, menos dado a explicações do sobrenatural, preso aos fios do romance, discutindo o amor e a paixão como forças existenciais e centrais para qualquer adolescente à procura de desabrochar enquanto adulto. O autor é adorado por muitos, mas é também indiferente para muitos outros, e este livro não contribui em nada para mudar opiniões. Deste modo resolvi questionar-me: porque gosto tanto de Murakami?


São várias as suas características que me interessam, desde logo, e talvez a mais relevante, seja o modo como cria atmosferas a partir dos cenários e dos personagens. Os espaços sui-generis das cidades japonesas misturados com os sentires distantes dos seus personagens, transportam-nos para uma dimensão ou realidade paralela. Tudo se passa como no nosso mundo, mas num ritmo muito mais lento, como se fosse necessário desacelerar para podermos observar a vida do lado de fora, assistindo à sua desconstrução nos detalhes daquilo que cada personagem vai fazendo ou dizendo. Porque se os personagens são misteriosos e carregados de idiossincrasias, o narrador não deixa de os apresentar num registo muito direto sem restrições morais ou sociais.

Comparando com outros livros dele, o mistério não dá espaço a elementos do sobrenatural, sendo preenchido com a fina linha entre a vida e a morte, o que acaba por transformar esta sua obra numa das mais melancólicas, exigindo dos seus leitores um estado apropriado à sua leitura.

Uma nota para quem tiver lido, ou for ler. Passei anos e anos sem nunca entender o sentido do aforismo de "Forrest Gump" (1994) que diz que "A vida é como uma caixa de chocolates, nunca sabemos o que nos vai calhar". Na verdade nunca fez sentido nenhum para mim, apesar de adorar o filme. Sim a vida é cheia de surpresas, mas daí a vê-la como um mero envelope de coisas, não consigo estabelecer qualquer analogia. No entanto Murakami consegue aqui pela primeira vez dar sentido a essa analogia, de uma forma bem distinta mas profunda, e que como diz Watanabe pode servir como verdadeira "filosofia de vida". Não vou revelar aqui o que é dito, deixo esse gostinho para quando chegarem a essa página, perto do final do livro.


Uma nota para a tradução. Li pela primeira vez Murakami por outro tradutor que não Maria João Lourenço (MJL) e foi muito bom. Não sendo uma grande tradução, perdendo-se alguma fluidez (ou talvez assim também seja por ser uma das primeiras obras de Murakami), gostei de ler a obra sem os constantes clichés da linguagem e cultura portuguesas imiscuídos no texto como tanto gosta de fazer MJL. Daí que não me tenha atraído nada que a Casa das Letras tenha adquirido os direitos e tenha lançado uma nova tradução feita por MJL. E posso dizer que ainda perdi mais essa vontade quando li um texto da própria a vangloriar-se de nem sequer se ter dado ao trabalho de ler esta tradução de Alberto Gomes. É mau, é sobranceria, e é pior ainda porque MJL nem sequer traduz diretamente do japonês.

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